terça-feira, 29 de outubro de 2013

Delia Elena San Marco*

Nos despedimos no metrô em São Paulo, em um sábado à noite. Você voltava de um concerto e eu iria para casa de minha vó depois de te ouvir cantar. Estávamos de branco e preto, você por uniforme do coral e eu por pura casualidade.
De lados opostos da estação eu brinquei de fazer sinais com os braços, como fazem os marinheiros. Os trens chegaram e interromperam nosso diálogo impossível.
Menos de um ano se passou e nunca mais pude saber se você compreendeu minha brincadeira de sinais.
Hoje, depois de jantar, me pus a ouvir uma gravação sua do Lundu Brasileiro. A música fluiu e então percebi que fluída é a música, é o trem, é a vida.
Mesmo que se grave a música, que se fotografe o trem e que se registre a vida em qualquer meio possível, é a fluidez que marca os momentos que passamos.
A memória daquela despedida não é a despedida, que foi eterna, mas uma lembrança. Só possível pela existência daquele momento. Aquele momento que foi nosso e que agora é só meu na minha memória, que também é fluída.

Não sei se nos encontraremos, no metrô de São Paulo ou no Tube Londrino, se retomaremos aquela lembrança ou deixaremos que a memória daqueles momentos também flua e possamos construir outros.


* Parafraseando J.L. Borges

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